26 janeiro, 2007

Gritos e Sussurros, de Ingmar Bergman

Falar um pouco do filme para os desavisados. Agnes está em seu leito de morte, sendo cuidada pela criada Anna e pelas irmãs Karin e Maria, que estão de visita. Lidando com a terrível doença da irmã e sua inevitável morte, as mulheres relacionam-se através de flashbacks, conflitos, carinhos, momentos de rara intimidade e histeria.

Perdão pelo péssimo sumário, não sei como expressar de maneira não-afetada a atmosfera do filme. É extraordinário. Tiro algumas conclusões do pouco que conheço sobre Bergman (a maior parte através de leitura, este é apenas o terceiro filme do sueco que vejo). O uso da cor é praticamente singular na sua filmografia, grande parte de suas obras filmadas em preto e branco. Em Gritos e Sussurro vemos o branco e o preto do figurino emoldurado pelo vermelho do cenário em quase todas as cenas. O vermelho é influência importante na psique dos personagens, explicitamente nas diversas "dissoluções para o vermelho" (fade to red seria um exagero de anglicismo e neologismo?) presentes antes e depois de flashbacks e alucinações. Expediente semelhante ao utilizado em Marnie, por Hitchcock, mas com algumas diferenças. Em Marnie há uma explicação diegética para a relação da heroína com a cor vermelha, já Gritos e Sussurros não pede nenhum explicação. Em ambos os casos, é um elemento exterior ao personagem que se relaciona com a sua memória.

Como diretor de teatro antes de cinema, Igmar Bergman é generoso com os atores. Consegue, numa expressão, num movimento quase imperceptivel do rosto captado pelo close (e quantos closes), expressar sentimentos muito fortes, não apenas femininos, mas humanos. Faço essa observação por que Gritos e Sussurros é um filme de mulheres. Isso porque os homens estão ali apenas como contraponto bruto, para tocar friamente e dizer o desnecessário. As mulheres tocam com a alma e falam com os olhos, revelam sentimentos singulares e tocantes com uma sutileza incomparável. O tema recorrente do toque de uma mão em um rosto remete a possibilidade de uma maior intimidade entre os personagens, que nunca vemos.

Em alguns momentos o filme me fez pensar em Teorema, de Pasolini, não só pelos dois filmes retratarem as empregadas como os personagens mais puros e inocentes. Talvez por um clima de explosão do nucleo familiar, talvez por um subtexto religioso quase oposto, mas que me agrada pela sutileza. É algo que não consegui captar claramente, muito menos desenvolver um idéia conclusiva sobre.